Como identificar quando o ‘beber socialmente’ vira dependência em álcool

O consumo de bebidas alcoólicas está presente em encontros com amigos, festas e reuniões familiares, mas pode virar um problema quando a quantidade de doses ingeridas e a frequência do uso saem do controle. A transição entre o “beber socialmente” e a ingesta abusiva nem sempre é percebida, mas alguns sinais servem de alerta, segundo especialistas. Se o consumo de álcool começa a atrapalhar relações e tarefas, se a tentativa de evitar a substância gera fissura ou síndrome de abstinência e se a pessoa começa a aumentar o volume de bebida ingerida para atingir o mesmo prazer, pode ser um caso de dependência ou uso abusivo de álcool.

De acordo com Zila Sanchez, professora do departamento de Medicina Preventiva da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), os critérios para o diagnóstico se baseiam nos problemas sociais, biológicos e psicológicos causados pelo consumo de álcool, e se dividem em três diferentes graus: leve, moderado ou grave.

“Se a pessoa apresenta fissura, que é aquela vontade muito grande de consumir álcool; se ela bebe e precisa de mais doses para ter o mesmo prazer que tinha antes, criando-se uma tolerância, esses são alguns dos sintomas. Outro critério, por exemplo, é a síndrome de abstinência, que é quando a pessoa fica sem o álcool e começa a passar mal, ou quando começa a ter problemas no emprego e na família porque está bebendo demais”, exemplifica a especialista.

O problema está descrito no DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), e 11 questões com respostas “sim” ou “não” ajudam na identificação. “O número de ‘sims’ que a pessoa tiver, ou seja, os sintomas que realmente acontecem com ela, vão pontuar para descrever se ela tem grau leve, moderado ou grave – se a pessoa não tiver nenhum daqueles sintomas, é porque não tem problema nenhum com o álcool”, explica Sanchez.

Como reconhecer os sintomas em si mesmo?

Embora as pessoas com o transtorno possam ter dificuldades em reconhecer os próprios sintomas e em aceitar ajuda, alguns questionamentos feitos a si mesmo auxiliam no entendimento. De acordo com Arthur Guerra, psiquiatra e presidente executivo do Cisa (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool), quem estiver em dúvida pode se perguntar:

  • Você já tentou parar de beber e não conseguiu?
  • Sente-se incomodado com críticas sobre o quanto ingere de bebida alcoólica?
  • Acha que bebe mais do que gostaria?
  • Tem que beber logo que acorda para diminuir o mal-estar?

“Caso a pessoa identifique que o consumo de álcool está sendo um problema, vale conversar com familiares e amigos próximos, além de buscar ajuda profissional, como uma consulta médica, e realizar acompanhamento psicológico”, explica Guerra.

Papel da família

Familiares e amigos são, em geral, os primeiros a notarem os prejuízos relacionados ao uso abusivo de álcool. “Primeiro porque, muitas vezes, a pessoa está mais violenta, mais agressiva; segundo porque ela fica bebendo o dia inteiro e acaba não fazendo as outras coisas da casa – a pessoa precisa ir para o trabalho e não foi, acorda de ressaca e precisa tomar uma cerveja para ficar bem, esquece os compromissos dela”, exemplifica Sanchez.

De acordo com a especialista, os familiares desempenham um importante papel na motivação e no incentivo para que a pessoa busque auxílio de um profissional de saúde, como psicólogo, psiquiatra ou terapeuta. “Essa família vai tentar conversar com a pessoa, mas, na maior parte das vezes, vai demorar até ela topar buscar ajuda. Por isso, esse processo tem que ter uma insistência, mas sempre de uma forma acolhedora”, explica.

Fatores de risco

O psiquiatra Arthur Guerra ressalta que existe um componente genético associado à dependência de álcool, mas que, embora ele eleve o risco de uso problemático da substância, não é determinante. “O ambiente de formação, a disponibilidade e facilidade de acesso, a permissividade dos pais, entre outros, são importantes componentes ambientais para o desenvolvimento da doença”, destaca.

Além disso, existem fatores de proteção que compensam os de risco representado pela genética. “A pessoa que começa a se envolver em outras atividades, que é superativo na escola, que não se envolve, por exemplo, com os amigos que bebem mais, começa a tomar algumas decisões na vida que acabam fazendo que ela se exponha menos ao álcool e nem desenvolva essa dependência”, explica Zila Sanchez, professora de Medicina Preventiva.

Segundo a especialista, quanto mais cedo uma criança ou adolescente ingerir álcool pela primeira vez, maiores são as chances de desenvolverem um transtorno relacionado ao uso de álcool na idade adulta, mesmo sem, inicialmente, preencherem os critérios de diagnóstico, que dependem de um tempo de consumo que elas ainda não têm. “Para o adolescente começar a perder a sua relação social, deixar de lado todas as suas atividades para beber, ter abstinência e fissura, acaba demorando um pouco mais. Então, muitas vezes, esses transtornos começam a aparecer no fim da adolescência e começo da idade adulta.”

Diferenças entre homens e mulheres

O álcool se comporta de forma diferente no organismo de homens e mulheres. “Primeiro, porque as mulheres produzem menos ADH (vasopressina), que é o hormônio que degrada o álcool no corpo, então elas ficam por mais tempo com o álcool no organismo. Segundo, porque elas têm uma quantidade de litros de sangue menor do que os homens, então, quando você tem menos líquido para diluir o álcool no corpo, a concentração vai ser maior”, explica Sanchez.

Isso faz com que, comparando homens e mulheres de tamanhos médios, a mulher tenha 30% maior concentração alcoólica tomando a mesma quantidade do que o homem. Com isso, elas têm maior probabilidade de problemas mesmo com níveis de consumo mais baixos.

Como tratar?

Os tratamentos para a dependência de álcool envolvem diferentes métodos, que podem ser adotados de forma combinada, de acordo com o psiquiatra Arthur Guerra. São eles:

  • Farmacológico (uso de medicamentos que diminuem a fissura pela bebida alcoólica);
  • Psicoterapia;
  • Grupos de ajuda mútua, como os Alcoólicos Anônimos;
  • Hospitalização, para casos mais graves;
  • Atividades físicas.

No entanto, o especialista reforça que não existe um tratamento padrão. “Cada paciente vai se encaixar melhor em algum dos tratamentos mencionados. O importante é que seja individualizado e humano, pois assim os resultados são melhores e mais consistentes”, explica.

Hipnoterapia

De acordo com a hipnoterapeuta Sandra Baruchi, “a hipnose combinada com os outros métodos tem apresentado bons resultados para tratamentos de vícios.

Prevenção

Para os especialistas, a melhor maneira de evitar os transtornos causados pelo consumo de bebidas alcoólicas na sociedade é por meio de políticas públicas de proteção social relacionadas à obtenção de álcool na sociedade. Zila Sanchez explica que a OMS (Organização Mundial de Saúde) lista diferentes práticas para que um país reduza o número de pessoas dependentes de álcool.

“A primeira delas é o aumento de preço. Quando você aumenta o preço da bebida, as pessoas têm mais dificuldade de comprar e, ao invés de beberem 10 latas, vão beber cinco. A outra questão é reduzir a disponibilidade. Hoje, por exemplo, o acesso ao álcool é muito fácil no Brasil. Você pede no aplicativo e, em meia hora, está na sua casa, a qualquer hora do dia, mesmo de madrugada ou sete horas da manhã.”

Já o psiquiatra Arthur Guerra destaca que é importante conscientizar a população sobre o impacto do uso nocivo do álcool na sociedade com dados e informações de qualidade, endossadas cientificamente. “A meu ver, o envolvimento conjunto do poder público, iniciativa privada e organizações da sociedade civil traz maior efetividade na prevenção de prejuízos e no tratamento dos danos causados pelo uso nocivo de álcool.”

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Fonte: https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2022/02/28/como-identificar-quando-o-beber-socialmente-vira-dependencia-em-alcool.htm

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Sobre o Autor

Prof. Sergio Enrique Faria

Dr. Sergio Enrique Faria é diretor do Estúdio da Mente. Neurocientista, Membro da Sociedade Brasileira de Neurociência e Comportamento e do Grupo de Estudos de Hipnose da UNIFESP. Doutor em Ciências da Educação, Mestre em Comunicação, Psicanalista, Parapsicólogo, Hipnoterapeuta e Neuroeducador com especializações em Neurociência Clínica e Educacional, Neuropsicologia, Neuropsicopedagogia, Psicanálise Clínica, Didática e Metodologia do Estudo. Trainer e Master Practitioner com formações internacionais em Hipnose e em PNL – Programação Neurolinguística. Líder de Aprendizagem certificado pela Harvard University (EUA). Professor de Hipnose e PNL. Palestrante e Professor em cursos de MBA e Pós-graduação em grandes universidades. Autor e coautor de livros e mais de 150 artigos em jornais e revistas.

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